sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Para além dos destinos da anatomia: as novas singularidades contemporâneas

Uma grande amiga, mãe de 2 filhos, casada, bancária me mandou um convite para participar de uma comunidade que ela criou no Orkut “Nasci pra ser mãe não para ficar em casa”. Ela deixou o emprego após o nascimento do segundo filho, porque queria estar mais perto deles. Diz estar feliz, mas sente falta de sua vida profissional e há momentos em que se pergunta se fez a escolha certa.
Este é um dilema enfrentado por muitas mulheres que inicialmente escolhem seguir uma carreira profissional e deixar de lado uma dedicação exclusiva ao lar e a família, mas com o nascimento dos filhos precisam rever tal decisão. O nascimento de um filho, para a grande maioria das mulheres, é algo arrebatador, pois muda muito a vida, a rotina, as responsabilidades.
Ouvi uma outra amiga, que não quer ter filhos, dizer que prefere uma vida radical, cheia de riscos e aventuras. Nossa! Risco maior do que ter um filho! É como se um pedaço de você estivesse por aí correndo e você quisesse o tempo todo saber onde.
Essa é uma questão contemporânea de mulheres que lutaram por seus direitos. Sabemos que há algum tempo os papéis de homens e mulheres eram bem definidos. Mulheres cuidavam da família em casa e o homem sustentava o lar e dava as ordens. E hoje? Depende. A mulher pode ou não trabalhar fora, o marido também, e nem sempre quem sustenta é quem manda. As relações de poder mudaram, a mulher deixou de estar apenas à sombra do homem. Convivemos hoje com essa grande conquista nas relações de gênero, mas ela advém de outras grandes mudanças.
Com o advento do Capitalismo, o mundo globalizado, o crescimento econômico, o privilegiamento das leis do mercado, da competição e do individualismo criou-se também uma ampla noção de liberdade sem limites, onde o indivíduo pode ser tudo que quiser, tudo depende dele. No feudalismo, ou nascia pobre ou rico, era a vontade de Deus e só. Contudo, essa ideologia trouxe muita insegurança.
Segundo Anzieu, na clínica hoje, mais da metade da clientela psicanalítica é constituída pelo que se chama estados-limite e/ou personalidades narcísicas. Homens e Mulheres vivem num nível de exigência grande, de muita insegurança, já que lidam com questões novas para ambos. E será que estes novos indivíduos, com todas estas novas exigências e desafios tiveram uma “mãe suficientemente boa” ou tiveram a chance de ser rei na fase da “onipotência infantil” como definia Winnicott. Será que eles estão preparados pra esta luta diária?
Quero dizer com isso que uma boa parte de nossos pacientes, apesar de estarem na corrida por bons empregos, serem bem sucedidos, ainda mostra-se completamente desamparados e inseguros em relação a eles mesmos. Ainda ouvimos dizerem “que não são nada” e que “não são capazes de ser amados”. É necessário nos debruçarmos sobre o desenvolvimento psíquico, dando condições para que o indivíduo possa se desenvolver e amadurecer, para que homens e mulheres possam usufruir dessas conquistas, reconhecerem seu esforço, lutando pelo que se quer, sabendo quem se é e o que já se conquistou. Pois muitas vezes, apesar de terem algum poder de consumo, as pessoas estão perdidas, correm, competem, se relacionam com o outro precariamente e acreditam q não são nada.
O momento exige que sejamos criativos para encontrar novas formas de estar no mundo para além dos papéis socialmente prescritos. Então como ser um homem ou uma mulher? Porque sabemos que biologicamente nascemos como tal, mas que há vários fatores para nos tornarmos Homem e Mulher, assim como nos tornarmos mãe, pois todas as mulheres, a princípio, podem parir, mas nem todas se tornam efetivamente mães. Para viver melhor e enfrentarmos todas essas complexidades é que precisamos estar inteiros, ter um contorno e um limite.

Alessandra Bustamante - alebust23@yahoo.com.br

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